sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

Vinho Chapinha em um conto de Alexei Rodrigues

Não me lembro bem onde foi, tampouco quando, mas lembro-me bem da cara do sujeito. Barba bem feita, cabelos amoldados por um pouco de gel, óculos caros e roupas de grife. Era ele um publicitário com sei lá quantos prêmios e, embora a profissão e o jeito indicassem o contrário, era um autêntico boa praça. E foi ele quem me disse certa vez em que eu receberia em meu apartamento uma bela garota, pra que não me preocupasse com a escolha do vinho, assunto que jamais dominei.
-No final das contas, dizia-me com ares de grande conhecedor dos mistérios da humanidade, o que interessa é impressionar. Compre belas taças e um decanter. Com esses apetrechos, até Sangue de Boi soará como o mais refinado vinho francês.
Foi o que fiz e, creiam, acabei me dando bem algumas vezes. E de tão bem, deitei-me na cama dos presunçosos quando, num jantarzinho maneiro com uma gatinha que curtia vinhos, pus à mesa o mais puro vinho Chapinha em meu decanter refinado. A noite não teve um final feliz.
Nunca mais a vi. A última notícia que tive dela foi no dia seguinte ao fatídico jantar quando, com uma voz nada amistosa, ela me ligou:
-Minha língua está azul, seu idiota.

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