sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Minha primeira vez: Grands-Échezeaux 1977

Não é que eu jamais tivesse encostado em um ou que não soubesse da utilidade de um decanter, mas a forma como aconteceu dessa vez foi mais profundo e mais especial, com direito a velas e nervosismo. Confesso que estava tensa. Medo de acontecer algo com a rolha, medo de o vinho estar uma merda, medo de não conseguir decantar direito, sei lá, medo é assim, não tem muita explicação. 

Tratava-se de um Grands Echezeaux 1977.  Não se deixe impressionar pelo vinho, essa safra na Borgonha não foi das melhores.  O clima transformou as boas condições do ano anterior. A chuva caiu constantemente, quase diariamente durante julho. A primeira quinzena de agosto contou com uma volta ao clima favorável, mas houve algumas tempestades violentas no final do mês.  Um setembro ensolarado ajudou a amadurecer as uvas e a colheita começou tarde, apenas na primeira semana de outubro.

Então, como não tive a sorte de nascer em 78 por uma questão de dias, já estava me convencendo a ter que seguir os conselho do baterista do Kings of Leon e desistir de presentes de aniversário safrados, a não ser, no meu caso, se for um vinho do Porto!!

Após a difícil tarefa de decantar e separar as borras, deixei a bebida aerar por mais de 4 horas. Nesse período, incorporei Maya do filme Sideways e fiquei ali pensando em como foi a safra, imaginando as pessoas que participaram da elaboração e contabilizando tudo que já aconteceu durante o tempo em que ficou ali na garrafa envelhecendo. Ah, as histórias... 

Separando as borras

No decanter, os aromas já estavam agradando, mas ainda estava tensa sobre o primeiro gole.  Poxa, é normal essa tensão quando você compra um vinho com essa idade, de um produtor que não é grande coisa, de uma safra que foi pior ainda.  Mas, what the hell, será que em 1977 já existia essa coisa de grandes e bons produtores?  Talvez naquela época o Marché aux Vins era o melhor que se poderia ter...

Para acompanhar, uma refeição à altura: Coq au Vin (que não era Coq, mas um frango mesmo).  Um dos dois teria que salvar a noite!

"Frango" au Vin
Coragem, enfim. Surpresa, surpresa, o vinho ainda estava bom!  Pode até ser que tivesse passado seu auge (não sei como é um Borgonha no seu auge), mas ainda estava agradável, muito agradável!

Vermelho âmbar com reflexos amarronzados e imagino que o fato de não ser uma safra boa se refletiu em um vinho ainda mais leve, ainda mais delicado, menos rico em aromas e menos denso em sabor, mas ainda refinado, com aromas típicos da Pinot Noir, encantador e muito fresco. Morangos e framboesas, alcaçuz, um pouco de chocolate e caramelo.  Foi se abrindo mais e mais com o tempo e atingiu um frescor surpreendente. 34 anos. Impressionante.  
Grands-Echezeaux 1977

Valeu cada minuto e cada gole.  E mesmo se estivesse muito ruim, acho que não me importaria, tinha uma raridade de 1977 nas mãos.  E sei lá quando terei uma oportunidade dessa de novo na vida!

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